14 set
2019

Devo, não nego. Pago no cartão!

Tenho certeza de que você consegue com certa facilidade reconhecer a dor física de uma pancada na canela e a dor emocional da separação física de alguém que você ama! Mas você consegue identificar a dor do pagamento?

Desde muito cedo conseguimos identificar uma picada de abelha, uma pancada na canela, e a dor da separação de alguém que amamos muito. O que desconhecemos é que sofremos também com a dor do pagamento. Sim!!! Ela existe e é causada pela dificuldade que temos em nos separar do nosso dinheiro. Essa dor não vem do próprio gasto, mas dos nossos pensamentos sobre o gasto. Quanto mais pensamos nele, mas doloroso ele fica. Pesquisadores, através de tomografia computadorizada, conseguiram evidências de que ela tem os mesmos reflexos da dor física, mesmos estímulos neurais. Então o famoso “doeu no bolso” é real!!! 

Minha avó materna morava em Goiânia, e quando eu era criança costumava passar as férias lá. Nós íamos para o Natal e por lá ficávamos durante as férias de janeiro. Minha mãe retornava para trabalhar e nos deixava um dinheiro para que pudéssemos comprar alguma coisa ou até mesmo nos divertirmos. Eu não recebia mesada naquela época. E essa era uma das únicas experiências em que eu tinha contato com o meu próprio dinheiro. E mais, era quando eu podia fazer as minhas próprias escolhas. Não sei como, mas eu costumavaao final das férias, ter quase a mesma quantia que tinha no inícioNa cidade em que eu morava não existia shopping, parques nem cinema. Então quando, nas férias, saíamos para passear eu ficava deslumbrada. Lembro-me que o que eu mais gostava era entrar nas lojas de fitas e discos de música. Passava um bom tempo escolhendo um exemplar. Mas pensava tanto que acabava desistindo e voltava pra casa sem efetivar uma compra. Hoje eu percebo que sim, eu sofria sem saber da dor do pagamento e tinha enorme dificuldade em me separar do meu dinheiro!  

Lembrando dessa experiência e confrontando com os dias atuais em que raramente as pessoas andam com dinheiro na carteira para fazer suas compras, vejo o quanto a modernização dos meios de pagamento nos tirou a consciência do que estamos consumindo.  

Ainda sobre a infância, me recordo de que quando pedia algo e minha mãe dizia “não tenho dinheiro esse mês, vamos comprar no mês x”, a conversa acabava. Mais uma vez lembrando, isso era na década de oitenta, momento de instabilidade econômica e elevadas taxas de inflação. Os instrumentos de crédito não eram como hoje e nem mesmo existia o cartão de crédito.  

Nos dias atuais temos dificuldades em manter um orçamento organizado. Sentimos grande necessidade de atender aos nossos desejos de maneira rápida. Não queremos nos chatear. Temos horror a estar por fora de determinadas tendências, como por exemplo conhecer o mundo. Vivemos uma pressão externa gigante pela imensa vitrine que temos na palma da mão  através das redes sociais. Temos grande dificuldade em programar o futuro, pois não nos reconhecemos lá. E por isso queremos viver o hoje como se não houvesse amanhã!!! 

Até aqui tudo bem, né? Continuamos sem educação financeiramas temos uma oferta de crédito gigante! Quase todos nós temos pelo menos um cartão de crédito. E não enxergamos a utilização dele como utilização de crédito. O vemos como um facilitador e acumulador de pontos para serem convertidos em milhas. 

Eu o vejo como o grande analgésico para evitar a dor do pagamento. E consigo ver os prejuízos da sua utilização indiscriminada. Hoje nós temos muita dificuldade em postergar o consumo de algo, pois acreditamos que com o cartão de crédito podemos tudo!   

E de fato ele nos tira a dor do pagamento, já que consumimos e pagamos em tempos diferentes. Isso nos anestesia. E para piorar nós costumamos parcelar, perder de vista, e para o nosso cérebro quanto mais distante o pagamentomenos dói. Para completar a sessão anestesia, o colocamos em débito automático, inibimos o envio de fatura para residência e, com isso, perdemos completamente a noção do que há por trás desse plástico poderoso. 

No dia a dia de atendimentos como planejadora financeira consigo perceber que 80% dos problemas de gestão têm relação com a utilização indevida do cartão de crédito. Por isso penso que precisamos tomar algumas atitudes antes que seja tarde demais. Segue algumas dicas que julgo serem importantes! 

  1. Se a opção é ter cartão de crédito, tenha apenas um. 
  2. Não parcele suas compras no cartão. 
  3. Tenha o hábito não só de conferir sua fatura, mas de analisá-la. Saiba exatamente com o que está gastando. De preferência categorize por tipo de despesa, se a sua operadora não o faz. 
  4. Crie o hábito de utilizar dinheiro para as pequenas despesas do dia a dia, isso o ajudará a manter um orçamento equilibrado. Com certeza o fará refletir melhor sobre consumir ou não. 
  5. Não deixe seu cartão gravado nos sites que tem o hábito de consumir. Prefira a cada compra digitar os dados, isso o fará pensar um pouco mais.  
  6. Cuidado com os aplicativos que através do cartão nos facilita o consumo. A soma de várias pequenas despesas pode arruinar seu orçamento. 
  7. Ah, já ia me esquecendo! Se não pode gastar, deixe o cartão em casa! 

No mais tenha coragem para ir contra a maré. Fique muito atento a modernização dos meios de pagamento. É preciso coragem para se manter presente e consciente nas suas decisões. 

Fique atento, pois nos próximos dias falarei bastante sobre atitudes que nos adoecem financeiramente. Se você achou esse conteúdo útil envie para aquela pessoa que está precisando de uma ajudinha! 

Beijos e até a próxima. 

 

a autora

Karina Valadares

Mãe, esposa, profissional de finanças e empreendedora. Dedico minha vida à consultorias financeiras pessoais, assessoria de investimentos e organização de rotina.

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